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Tribunal do Trabalho de Lisboa reconheceu Contrato de Trabalho de Estafeta de Plataforma Digital Tribunal do Trabalho de Lisboa reconheceu Contrato de Trabalho de Estafeta de Plataforma Digital
06 February 2024

Tribunal do Trabalho de Lisboa reconheceu Contrato de Trabalho de Estafeta de Plataforma Digital

Enquadramento

O Tribunal do Trabalho de Lisboa reconheceu, por sentença proferida no dia 01.02.2024, o contrato de trabalho de um estafeta com uma plataforma digital.

Esta é a primeira decisão de um tribunal português na sequência da Agenda do Trabalho Digno, aprovada pela Lei n.º 13/2023, de 3 de abril, nos termos do novo artigo 12.º-A, que determina que indícios devem ser tidos em conta para presumir a existência de um contrato de trabalho em plataformas digitais.

 

Que tipo de ação é esta?

No caso, a decisão decorreu de uma ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho. Esta é uma ação especial que tem duas fases. Uma fase administrativa, conduzida pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) que fiscaliza as relações de trabalho, e uma fase judicial impulsionada pelo Ministério Público (MP), que toma conhecimento das relações irregulares após aviso da ACT. Trata-se de uma ação pública, uma vez que não é exigida a intervenção do trabalhador.

 

O que decidiu o Tribunal do Trabalho de Lisboa?

O Tribunal do Trabalho de Lisboa considerou que deveria existir um contrato de trabalho entre a plataforma digital e o estafeta, declarando-o com efeitos retroativos a 01.05.2023.

A decisão foi fundamentada pelo Tribunal nos indícios de subordinação jurídica, nomeadamente no facto de ser a plataforma quem fixa unilateralmente os valores que o estafeta recebe pelas entregas – sem qualquer negociação prévia dos critérios utilizados para a definição dos valores –, a possibilidade de a plataforma exercer poderes de exclusão de futuras atividades na plataforma, através da desativação da conta, bem assim como o facto de controlar e supervisionar a atividade do estafeta e restringir a sua autonomia quanto à organização do trabalho.

No mais, o Tribunal não reconheceu à plataforma uma mera posição de intermediária entre o estafeta e o cliente, com vista à alocação da tarefa, considerando que está em causa uma atividade aparentemente autónoma, mas prestada em condições análogas à de contrato de trabalho.

 

O que diz a lei?

A última grande alteração à lei laboral portuguesa, introduziu no Código do Trabalho o novo artigo 12.º-A que estabelece os indícios da presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital. Anteriormente, o artigo 12.º já determinava um conjunto de indícios que, estando verificados, levavam à presunção de existência de contrato de trabalho, colocando sobre a entidade empregadora o ónus de ilidir a presunção, demonstrando que, na verdade, não estava em causa uma relação laboral. As novas alterações trouxeram este novo artigo, adaptado às novas realidades de trabalho, trazidas pela “plataformização” do mercado de trabalho.

Atualmente, o Código do Trabalho diz-nos que poderemos estar perante um contrato de trabalho nomeadamente quando seja a plataforma a fixar a retribuição para o trabalho efetuado, quando a mesma tenha o poder de supervisionar ou dirigir o trabalhador, restringir a sua autonomia, ou mesmo quando os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados lhe pertencem ou são por si explorados através de contrato de locação.

Assim, o poder de supervisionar ou dirigir o trabalhador pode-se traduzir no controlo, em tempo real, da prestação da atividade, verificação da qualidade da sua execução, restrição da autonomia do prestador da atividade no que respeita ao horário de trabalho, períodos de ausência, possibilidade de aceitar ou recursar tarefas, possibilidade de utilização de subcontratados ou substitutos, ou através do célebre exercício do poder disciplinar.

Ademais, a plataforma digital não pode estabelecer termos e condições de acesso à prestação da atividade, incluindo na gestão algorítmica, mais desfavoráveis para os prestadores da atividade que estabeleçam uma relação direta com a plataforma, comparativamente com as condições definidas para as pessoas, singulares ou coletivas, que atuem como intermediárias da plataforma digital, para disponibilizar os serviços através dos respetivos trabalhadores.

 

Conclusões

Veremos, no futuro, se mais tribunais tomarão decisões baseando-se na mesma fundamentação e critérios. Porém, esta decisão já permite prever que as relações laborais entre plataformas digitais e estafetas poderão ser substancialmente modificadas.

 

Por José Maria Coelho

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